quarta-feira, 18 de maio de 2011

Releitura de um clássico: "Casa-Grande & Senzala" de Gilberto Freyre, na visão do Historiador José Carlos Reis.


Sua obra (Gilberto Freyre) escrita durante a década de 1930 é reconhecida e premiada internacionalmente como referência nas ciências sociais, no entanto, Freyre recusa sua “classificação” como sociólogo, historiador, antropólogo, “sempre se apresentou como escritor ou ensaísta”. Para seus analistas, sua obre é entremeada de racionalidade, afetividade e subjetividade, sendo escrita através de uma “auto-antropologia da cultura na qual nasceu, a nordestina-brasileira”.

Sua escrita é coloquial, quase um dialogo entre passado e presente. Transpôs-se ao passado, tudo o que escreve, escreve de maneira íntima, como se tivesse vivido aquele passado. Tem influências diretas de Proust.

Um autor sensível aos variáveis estímulos, o período colonial é percebido com suas características, “o seu cheiro e prazer de viver”. Um avanço colossal do modo como nos conhecemos, brasileiros.

Como historiador, desprezou a história político-administrativa-militar, progressista, evolucionista, a linearidade. Optou por uma história rotineira, “onde se sente melhor o caráter de um povo”.

Curiosamente, descobriu juntamente com os Annales a renovação das fontes históricas, a história cotidiana, as mentalidades coletivas, etc. Sua obra “pode ser considerada a obra de um brasileiro-mestiço genial”!

Casa Grande & Senzala, é uma obra política, orquestrada em um ritmo contínuo linear, mas contendo solos, estribos, etc. Tendo uma estrutura clara e sólida, o primeiro capítulo tratando de características gerais, e outros quatro tratando de temas (teses) relacionados ao português, ao negro e ao índio. O negro nessa obra ocupa dois capítulos, diferenciando-se de Varnhagen que os mencionam rapidamente.

Para Freyre, o negro não comprometeu a colonização e o sucesso português na América, mas pelo contrário, foi um agente muito importante para tal feito.

Sua obra gira em torno de cinco teses, o corpo principal de seu livro, quando não está tratando destas, está escrevendo algo que confirma suas teses.

1ª tese: Encontro entre as três raças constituidoras do povo brasileiro:

- Caracteriza-se por um encontro fraterno, viabilizado pela miscigenação. Quando a vitória militar portuguesa foi consolidada, houve uma confraternização entre vencedores e vencidos, essa relação era adocicada com a necessidade dos colonos de constituírem uma família. Essa relação social aproximou a casa grande e a senzala. A colonização portuguesa foi a única que conseguiu construir uma sociedade moderna nos trópicos, uma vez que o resto da população européia amoleciam em contato com os trópicos, e não se misturavam. O português venceu a nova terra e miscigenou-se, criou-se assim a fusão harmoniosa de tradições diversas de cultura.

2ª tese: Como foi possível a miscigenação com relação ao português:

- A “democracia racial” só foi possível devido ao passado étnico e cultural do português, que favorecia a miscigenação. Etnicamente, os portugueses já são miscigenados, são um povo ao mesmo tempo europeu, africano e semita, móvel, adaptável, sem orgulho de raça. Freyre tem grande admiração pelo colonizador português, que segundo ele, deveria também o brasileiro orgulhar-se de ter sua origem entrelaçada com os colonizadores. Traz também uma nova leitura da miscigenação, sendo referência no mundo pós-1945.

3ª tese: Lugar central de encontro “feliz” entre as raças, sob liderança portuguesa:

- A casa grande é o principal “palco” de encontro, que não se separa da senzala, mas a incluindo. Uma construção tipicamente brasileira, adaptada as condições tropicais e à nova atividade, a monocultura. Os sujeitos históricos são as famílias rurais portuguesas, e não a família real. Sendo iniciativa particular que promoveu a mistura das raças, favorecendo o desenvolvimento da estabilidade colonial nos trópicos.

4ª tese: A miscigenação e a degeneração do brasileiro.

- A degeneração do tipo físico do brasileiro, não se deve à miscigenação. Freyre ressalta que o principal vilão foi a monocultura latifundiária com a falta de variedade na alimentação do brasileiro. “A colonização patriarcal do Brasil, explica-se menos em termos de raça e religião e mais em termos econômicos, culturais e afetivos”. A miscigenação foi vantajosa, formou um tipo de homem ideal, moderno para os trópicos, um europeu com sangue de negro e índio.

5ª tese: Tipo de regime apropriado para um povo miscigenado:

- Para Freyre, a relação entre senhor/escravo é sadomasoquista, marcado pela relação sexual e violência. O brasileiro filho dessa relação, é apreciador do mandonismo, do senhor no seu papel. Sendo o regime ditatorial o mais adequado. “O negro revelou-se superior ao índio e ao próprio português em vários aspectos da vida material e moral, técnica e artística [...] foi o maior ‘colaborador’ do branco na colonização”. tornando-se “a sociedade brasileira uma das mais democráticas, flexíveis e plásticas”.

O historiador José Carlos Reis, professor da Universidade Federal de Minas Gerais, é atualmente um dos mais reconhecidos autores brasileiros quando o assunto é historiografia e espistemologia da história.

Este artigo contém apenas parte do trabalho de fichamento elaborado para a disciplina "Historiografia Brasileira II" 7º período, para a instituição UNI-BH, 1º/2011.

Fonte:

REIS, José Carlos. As identidades do Brasil: de Varnhagen a FHC. 2. ed. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, 1999. 278 p.

ALBERGARIA, Danilo. José Carlos Reis: O impacto da teoria de Lévi-Strauss além das fronteiras da antropologia e a superação do estruturalismo. Disponível em: <http://www.comciencia.br/comciencia/handler.php?section=8&tipo=entrevista&edicao=52> acesso em: 18 mai. 2011.

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